quinta-feira, 21 de agosto de 2014

                                                     "If by my life or death I can protect you, I will.                                                                                                  You have my sword."

Você sabe, a vida anda difícil. Pra você e pra mim. A vida anda tão difícil e tão custosa que nós vamos nos agarrando a qualquer coisa ou galho mínimo e frouxo que aparecer pelo caminho. Até alguns dias atrás, meu galho era você. Você era um Salgueiro. Não sabe o que é? Você é um Salgueiro-chorão. Também nunca vi um. Acho que não nasce aqui, mas você era um Salgueiro-chorão e eu me agarrava à sua rama com toda a força que podia, embora com medo de que o galho pudesse arrebentar. Vez ou outra, cansada de me dependurar , descia do galho e me sentava encostada ao seu tronco, entre suas raízes. Ficava ali durante um tempo, sob sua sombra. Acontece que eu cansei. Eu me fartei de ora ficar sob sua sombra, ora ver você como meu único recurso e salvação. Cansei e fui cortando o galho, afastando-me da sua sombra. Continuo esse caminho tortuoso, tentando me encaixar em algum lugar, em alguma coisa que me sirva, sem me agarrar, sem depender. Vou seguindo da maneira que consigo, mas que maneira é essa eu nem sei.
Não queria ser essa pessoa que se agarra ao seu galho. Queria ser um Salgueiro-chorão, assim como você. Queria ser essa árvore grande e bonita e pendular que você é. Queria nascer ao seu lado, crescer ao seu lado e fazer por você o que você faz por mim. Queria compartilhar a sombra e os galhos. Queria que nos balançássemos neles não por obrigação, mas por sermos livres e ditosos. Você precisa ser feliz, você sabe? Você é tão lindo e tão especial que eu queria fazer por você esse monte de coisa boa que você faz por mim sem perceber, mas sem depender, sem me agarrar. Também não gostaria que se agarrasse a mim. Não acho saudável, nem pra você, nem pra mim. Eu fui cortando o galho porque você teve medo de que eu não conseguisse nunca mais descer e me chicoteava com todo os outros para que eu me desprendesse. Não precisa ser assim, você sabe? Você me entende e sabe que eu te entendo, mesmo ninguém compreendendo o que você fez e faz. Quero compartilhar uma coisa assim qualquer como essa fresquidão das nossas sombras, como esses anos que ainda vamos carregar nos galhos, as folhas que ainda vamos trocar no inverno. Quero que a gente esteja lado a lado para suportar a troca da casca. Quero ver agora o seu Salgueiro-chorão perder a cortiça e mostrar-se. Quero que você me mostre o seu verdor, sem medo, sem amarras, pressa, nem pressão.
Eu vou ficar aqui ao seu lado, tentando ser um Salgueiro-chorão tão bonito e vistoso como você, pra ver se um dia você também me deixa balançar no seu galho em uma tarde de sol debaixo da sua sombra.


segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Uma vez conheci uma garota. Era magra e tão baixa que eu poderia cobrir todo o seu corpo com o meu. Era regida pelo Sol e eu percebia isto em cada lugar por onde passávamos. Parecia que ela tinha luz própria; todos viravam para observá-la e os olhares a seguiam até que sumisse de vista ou até que percebessem que sua luz não brilhava para eles, para nenhum deles. Era para mim que ela sorria sempre, aquele sorriso frouxo e lasso, como se seus lábios estivessem sempre cansados. A primeira vez que a vi, quis entrar como um louco dentro dela, em todos os sentidos, e descobrir como aquela criatura conseguia ser tão surrealmente encantadora e diferente de todas as outras. Ninguém tinha aquele perfume e jamais poderia ter. Era como se uma flor tivesse existido uma única vez para dar a ela uma característica singular que não se encontraria em nenhuma outra mulher e que ficaria presa ao meu corpo para sempre. Tudo nela me chamava absurdamente e isso me dava um medo paralisante. O que se sucedeu a partir de então foram dias loucos, tormentas, dias ensolarados de queimar a pele, nevasca e terremoto. Estar com ela era como não ser constante em momento algum. Um dia ela era maluca e me odiava por não avisar quando ía embora. Sentia-se deixada para trás, era o que dizia. No outro, ela era quase santa. Porém, nunca casta. Um dia ela queria rasgar minha roupa no meio da rua e no outro queria só segurar minha mão e me puxar para perto. Um dia ela me procurava com saudade e no dia seguinte parecia que eu já não existia. E eu sei que ela queria mesmo que eu nunca tivesse aparecido aquela noite. Mas tudo o que ela fez foi porque lhe tirei tudo o que pude e a mantive por perto enquanto me era oportuno. Fui mesquinho com o que ela sentia por mim e a colocava à prova, mas ela era conivente com os meus erros porque tinha medo de me perder. E eu continuava me aproveitando disto. Continuei tirando tudo o que podia. Primeiro tirei seu sono, depois tirei sua fome. Por fim, tirei seu juízo. Eu a transformei em uma louca desvairada. Toda noite ela dormia com a tv ligada porque não suportava mais o peso dos seus pensamentos; eu estava sempre neles, tirando sua sanidade. E a única coisa que ela queria era que eu lhe acompanhasse até em casa, contasse-lhe minhas histórias e a fizesse rir até chorar. Queria que eu lhe desse um beijo no meio da praça, para saber que eu me importava com ela. E eu me importava. Apesar de todas as vezes em que não atendi suas ligações, de todas as horas que a deixei esperando por uma resposta ou apesar de todas as respostas que ela não recebeu, eu me importava. De um jeito não usual e mudo, ora estranho e incompreensível, queria mantê-la ali, queria que ela sentasse no bar comigo, queria que ela lembrasse de mim quando estreasse o filme que ela esperou dois anos para assistir. Queria que apenas eu pudesse ver seus olhos brilhando ao segurar sua mão sem aviso. Ela transformou minha vida de tantas maneiras diferentes, revirou minha cabeça de tantas maneiras diferentes que tive medo que ela pudesse fazer isso em outras vidas. Sei que todos queriam estar no meu lugar junto a ela na cama. Todos queriam vê-la acordar com o rosto vermelho, queriam vê-la ofegar, queriam vê-la pular e dançar feito louca, os braços pro alto, o cabelo bagunçado. Tudo o que só eu podia ver, tudo o que ela queria que só eu pudesse ver, deixei para trás entre o beijo de bom dia de uma boca entreaberta em sono e o primeiro e último gole no café.